Povoado castrejo entre Afife e Âncora, com vista sobre o mar. Casas circulares, forno, fonte e espaço funerário revelam uma comunidade bem estruturada — ainda pouco conhecida.
Entre o mar e os pinhais, vestígios de um povo que vigiava a costa
No alto do monte que separa Âncora de Afife, oculto entre pinhais e fora dos roteiros mais conhecidos, encontra-se um dos povoados castrejos mais bem conservados do litoral minhoto: a Cividade de Âncora.
Este sítio arqueológico remonta à Idade do Ferro e manteve ocupação até ao período romano. A localização estratégica — com vista ampla sobre o mar e os vales interiores — evidencia a sua importância no controlo das rotas de circulação entre o litoral atlântico e o interior da antiga Gallaecia.
Organização e vestígios
As escavações revelaram uma comunidade bem estruturada, com:
- habitações circulares e retangulares, algumas com vestíbulos,
- pátios comuns delimitados por muros,
- um forno comunitário,
- uma fonte escavada na rocha,
- um recinto funerário com caixas sepulcrais,
- fragmentos de cerâmica e utensílios do quotidiano.
Estes elementos demonstram não só uma adaptação cuidadosa ao relevo, como também conhecimentos sólidos de construção, organização doméstica e práticas ritualizadas em torno da vida e da morte.
Apesar da sua relevância, a Cividade de Âncora permanece pouco visitada. A envolvente natural contribui para essa discrição: pinheiros, trilhos de terra e silêncio. No entanto, é precisamente esse isolamento que preserva o ambiente do lugar — e permite a quem sobe ao monte entrar num outro ritmo.
Leitura simbólica do território
No contexto do Guia Ophiussa, este é um ponto de contacto com a estrutura invisível do território ancestral:
- O monte funciona como observatório natural e espaço de permanência.
- As casas em círculo sugerem uma conceção de tempo e comunidade diferente da nossa.
- A água, a morte e o fogo aparecem organizados em zonas específicas — marcando rituais e funções.
A Cividade de Âncora está atualmente em processo de classificação como Monumento Nacional. Visitar o local é mais do que ver ruínas: é reconhecer um padrão de vida que se repetiu por gerações e que deixou marcas físicas ainda visíveis — mesmo quando a memória coletiva já quase as esqueceu.