Os galaicos foram um conjunto de povos que habitaram o noroeste da Península Ibérica, abrangendo o atual Norte de Portugal, Galiza, Astúrias e parte de Castela e Leão.
Eram parte da chamada cultura castreja, caracterizada pela construção de povoados fortificados em colinas ou planaltos, conhecidos como castros, estrategicamente localizados para defesa e controle de território. Esses povos, descendentes das populações neolíticas da região, desenvolviam uma cultura própria desde o final da Idade do Bronze, por volta do século IX a.C., e mantinham-se em atividade até ao domínio romano.
Origem e Influências Culturais
A cultura galaica é uma fusão de influências atlânticas, mediterrâneas e celtibéricas. A sua economia baseava-se na agricultura, pastorícia, metalurgia e tecelagem. No entanto, a sua riqueza em minérios, como ouro e estanho, também os ligava a rotas comerciais que iam desde o Atlântico até ao Mediterrâneo. Apesar de serem frequentemente classificados como celtas, a sua cultura e língua não apresentam uma correspondência direta com a civilização celta clássica, sugerindo que os galaicos formaram uma identidade única.
Organização Social e Militar
Os galaicos viviam em tribos independentes, com uma hierarquia social bem definida. As suas aldeias fortificadas, ou citânias, podiam ser pequenas ou grandes, dependendo da importância estratégica. Os castros mais emblemáticos como a Citânia de Briteiros, Citânia de Sanfins e o Castro de São Lourenço revelam o desenvolvimento de uma sociedade complexa, com ruas pavimentadas, muralhas defensivas e divisões residenciais.
A defesa dos castros era crucial para a sobrevivência da população galaica. As suas habilidades de combate e táticas de guerrilha tornaram-nos conhecidos pela resistência feroz, especialmente durante as guerras contra Roma. As descrições de autores antigos, como Estrabão e Plínio, destacam as suas qualidades de guerreiros habilidosos e espiritualmente ligados aos seus deuses e terras.
Religião e Espiritualidade
Os galaicos eram profundamente religiosos, com uma ligação espiritual à natureza. Os seus deuses estavam associados a elementos como as águas, montanhas e astros. Entre as divindades mais veneradas estava Nabia, deusa das águas, e Reva, deus supremo ligado à justiça e aos rios. Locais sagrados, como a Fonte do Ídolo, em Braga, testemunham esta forte religiosidade.
Sacrifícios de animais e, em casos extremos, humanos, eram parte integrante dos rituais religiosos. Estrabão relata que os galaicos acreditavam no poder das águas e do fogo como purificadores e elementos de ligação com o divino.
A Cultura Castreja
A cultura castreja distingue-se pelas suas características arquitetónicas e artísticas. As casas eram, na sua maioria, circulares, construídas com pedra e telhados de colmo. No interior dos castros, existiam zonas comunitárias, como áreas de reunião e, em alguns casos, balneários rituais, onde ocorriam banhos purificadores associados a rituais religiosos.
A arte galaica, especialmente a ourivesaria, destaca-se pelas suas peças em ouro e bronze, como os famosos torques, usados pela nobreza galaica, e as estátuas de guerreiros, encontradas em diversos castros, que simbolizam o poder e a bravura dos seus líderes. Outros artefactos, como armas e ferramentas, demonstram a habilidade destes povos na metalurgia.
Legado e Integração Romana
Apesar da sua resistência, os galaicos foram progressivamente integrados no Império Romano após a conquista por Décimo Júnio Bruto Galaico, em 136 a.C. Esta integração não apagou completamente a sua cultura. Durante o período romano, muitos castros continuaram habitados e os galaicos adaptaram-se ao novo contexto sem perder completamente as suas tradições, como se observa na permanência de cultos e práticas religiosas até ao fim do Reino Suevo, no século VI d.C.
Castros Relevantes no Minho
Entre os castros mais significativos no território do Minho, encontram-se:
- Castro de São Lourenço (Esposende): Importante sítio arqueológico, habitado desde o século IV a.C., com muralhas e casas circulares que mostram a evolução da cultura castreja. A sua localização estratégica no litoral o tornava essencial para o controle da costa.
- Citânia de Briteiros (Guimarães): Um dos maiores castros da Península, com ruas pavimentadas e estruturas defensivas robustas. Escavações revelam a influência romana na organização urbanística do local.
- Citânia de Sanfins (Paços de Ferreira): Um exemplo de povoado castrejo fortificado com uma extensa área habitada, que sobreviveu até ao período romano, refletindo uma transição cultural significativa.
Conclusão
Os galaicos e a cultura castreja representam um dos legados mais fascinantes da história do noroeste da Península Ibérica. A sua resistência, organização social e religiosidade deixam marcas indeléveis na história e identidade da região. A exploração dos seus castros oferece uma janela para o passado, revelando a resiliência e originalidade de um povo que resistiu ao tempo e às mudanças culturais impostas pela romanização.